terça-feira, 29 de setembro de 2020

A Epístola aos Filipenses

Enquanto a origem do conflito na Galácia possa ser atribuída às más doutrinas e aos que a promoveram, a situação em Filipos foi muito diferente. A carta de Paulo aos filipenses não é corretiva. De fato, eles parecem ter passado por nada além de provações esperadas na jornada no deserto. No entanto, Paulo estava na prisão e estava preocupado com o bem-estar deles durante sua ausência. Sua carta não é diferente da admoestação de José a seus irmãos: “E não vos pese cousa alguma...; não contendais pelo caminho” (Gn 45:20, 24). Destes versículos, especialmente o segundo parece ter estado na mente de Paulo.

No primeiro capítulo, encontramos algo da condição geral das coisas na Cristandade. Paulo estava na prisão[1] e, embora o evangelho fosse pregado, havia pouco a trazer-lhe gozo – ainda assim ele se regozijava. “Alguns pregam a Cristo por inveja e porfia” (Fp 1:15). Sim, até mesmo o evangelho pode ser apresentado com inveja e contenda! Pregamos o evangelho para ganhar almas, não para ganhar troféus. No final desse capítulo, começamos a ouvir sobre a preocupação do apóstolo pela assembleia em Filipos: “estais num mesmo espírito... com o mesmo ânimo” (Fp 1:27). No segundo capítulo, Paulo se expressa mais plenamente. A assembleia enviou-lhe uma oferta de comunhão (Fp 1:5; 4:10), mas se eles o quisessem completamente feliz, ele tinha de saber que estavam juntos sem discórdia. “Completai o meu gozo, para que sintais o mesmo, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentindo uma mesma coisa. Nada façais por contenda ou por vanglória, mas por humildade; cada um considere os outros superiores a si mesmo” (Fp 2:2-3). Como podemos fazer isso? Como podemos sentir o mesmo? É chegando a um acordo comum? Não, só há um caminho: “De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus” (Fp 2:5). É somente tendo a mente de Cristo que poderemos prosseguir em paz e harmonia. Muito mais poderia ser dito, mas o espaço não permite – leia este capítulo e medite sobre ele, tendo em mente o assunto[2].

O terceiro capítulo começa com avisos não muito diferentes dos encontrados no livro de Gálatas. No entanto, enquanto os mestres judaizantes fizeram o trabalho maligno na Galácia – “Corríeis bem; quem vos impediu, para que não obedeçais à verdade?” (Gl 5:7) – em Filipos, os santos são simplesmente avisados do perigo. O perigo, no entanto, era muito real. Qualquer coisa que nos desvie e tire nossos olhos da “soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Fp 3:14) não só nos fará tropeçar espiritualmente, mas também resultará em conflito carnal no caminho Cristão (vs. 15-17). Devemos ter um objetivo diante de nós: Cristo. O apóstolo pôde escrever: “Prossigo para o alvo” (Fp 3:14). A correta condição espiritual é encontrada no segundo capítulo, mas a energia da fé e o propósito do coração são expressos no terceiro.

No capítulo quatro, temos uma aplicação muito prática dos capítulos anteriores. Em Filipos, existia um conflito entre duas mulheres, Evódia e Síntique. Paulo não diz “trabalhem juntas” ou “resolvam suas diferenças”; ele nem mesmo lhes pede para “se darem bem”. Nenhuma dessas coisas chega à raiz do problema e, na prática, elas não funcionam. Havia apenas uma maneira de remover o conflito: “Rogo a Evódia, e rogo a Síntique, que sintam o mesmo [sejam de mesma mente – JND] no Senhor (Fp 4:2). E que mente é essa? É a mente de Cristo. “De sorte que haja em vós o mesmo sentimento [a mesma mente – JND] que houve também em Cristo Jesus. Que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus. Mas aniquilou-Se a Si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-Se semelhante aos homens; E, achado na forma de homem, humilhou-Se a Si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz” (Fp 2:5-8). Com muita frequência, nosso foco é a outra pessoa. Isso não leva não envolvimento, mas sim ao confronto. É somente quando fazemos do Senhor Jesus Cristo nosso foco, que as coisas começam a ganhar a perspectiva correta. A proximidade de Cristo nos permitirá ver a outra pessoa como Ele a vê, e nossos pensamentos serão formados por Seus pensamentos.

Estariam os outros indiferentes ao conflito? Não, o apóstolo apela a um irmão local para ajudar: “E peço-te também a ti, meu verdadeiro companheiro, que ajudes essas mulheres que trabalharam comigo no evangelho” (Fp 4:3). Quando ocorre um conflito, gostamos de manter distância, e é fácil entender o porquê. É preciso discernimento para saber quando ajudar. As coisas podem facilmente sair do controle quando tomamos partido, ou quando alguém não é qualificado espiritualmente (Gl 6:1). O Senhor, porém, diz: “Bem-aventurados os pacificadores” (Mt 5:9)



[1] N. do A.: Figurativamente, isto também se aplica à doutrina de Paulo.

[2] N. do A.: Consequentemente, o versículo 12 fala da assembleia – não de salvação individual.

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